terça-feira, julho 07, 2009

Porque estou por aqui..

Ah, Paris.. Quando o país foi afixado no quadro fiquei algo desanimado. A semana de campo preparava-nos para os mais exóticos desafios e Paris não me pareceu tão exótico. Que vou eu descobrir nesta cidade, conhecida pelo seu charme de revoluções, manequins e intelectuais?
Cidade medieval rejeitada por Luís XIV, que, a despeito dos parisienses, preferiu governar como deus sol do seu Château de Versailles, sofre uma profunda metamorfose na segunda metade do século XIX, que lhe atribui a aparência que hoje conhecemos. Napoleão III, delega ao prefeito de Paris, Georges Haussman, a condução de uma transformação que irá alterar 60% da cidade, atravessando-a com largas avenidas, ladeadas de edifícios de cinco ou seis andares, e instituindo a esquadria em triângulo - que aumenta o numero de fachadas sobre a rua, mas desorienta qualquer novato nos meandros da cidade.
É nesta altura que Monmartre é agregada à cidade. Berço do movimento impressionista e do circuito boémio do Moulin Rouge, viu passar Monet ou Degas, Toulouse Lautrec ou Picasso (até mesmo a Amelie Poulin). Hoje, o Moulin Rouge nao é mais do que uma utilização gasta do fascínio do passado, sem brilho e sem interesse. Partimos deste bairro para ver a vista sobre a cidade: subimos do Pigale à Place des abbesses, esgueiramo-nos por uma pequena rua de edifícios baixos e já se apresentam as pequenas esplanadas, dispostas ao primeiro raio de sol, não importa o pedaço de passeio que lhe foi atribuído. Subimos umas escadas, e chegamos ao Rendez Vous Des Amis. Aí aproveitamos para beber uma cerveja, enquanto observamos a vista sobre a cidade insinuando-se entre dois edifícios. Mais acima está o Sacré Cœur. A vista é esplêndida, mas os turistas abundam.
Se projectaram o Concorde ou o TGV, os franceses não demonstraram menos génio ao instalar as Velibs em Paris. Com 20 bairros, um terreno relativamente plano, e uma imensidão de sítios de interesse a visitar, Paris foi feita para pedalar! A cada 300 metros, uma estação com bicicletas confortáveis e prontas a usar. A cidade é afável com os ciclistas, que gozam um estatuto respeitado: meio caminho entre estrada, as ciclovias e os circuitos para peões. Pego na minha velib. Vejo as fachadas seguirem-se e pedalo junto ao Sena. Lá à frente a Notre Dame já se descobre, rodeada de árvores, e todas as pontes que parecem se atropelar para a abordar. Já passámos St. Michel e a Pont Neuf e uma multidão de japoneses acena entusiasta dos barcos que passam, um a seguir ao outro, lentamente, Sena a cima, Sena a baixo, enquanto grupos de amigos se aglomeram na borda do rio, tragam baguettes com chèvre e trocam brindes de rouge ao final da tarde. A Torre Eiffel insinua-se por trás do museu d’Orsay que avistamos ao fundo, ao atravessarmos a ponte em direcção à outra margem. Passamos os arcos e entramos no carrousel do Louvre, seguindo com a imaginação os cavaleiros que ai troteavam para o Rei e já a pirâmide do museu nos desperta para a realidade e descobrimos as tuilleries à nossa esquerda, a prometer um passeio em jardins desenhados a régua e esquadro, à francesa, plenos de linhas rectas e simetrias.
Colorido e de arquitectura industrial, o museu Pompidou ergue-se imponente no coração do Marais, indiferente ao contraste evidente que cria com os edifícios circundantes. Abriga obras de Kadinsky, Brzeska ou Pollock. Mas, se subirmos até ao último andar, descobrimos que algo mais se revela. O edifício foi construído um pouco mais alto que os edifícios à volta. O suficiente para compreendermos que o andar cimeiro foi reservado para os principais monumentos da cidade, ou talvez apenas para nos lembrar da sua presença. E lá está o Sacre Cœur, a vigiar a cidade do topo da colina, a Opera, Les Halles, a Bolsa, os telhados do Louvre ou a Torre Eiffel.
Em Paris, uma viagem à Índia fica para os lados da Gare du Nord e Beijing é logo ali, em Belleville. Um transeunte inadvertido será surpreendido ao aproximar-se da Rua Faubourg St Denis. Existe uma fronteira invisível para lá da qual viajamos 7 mil quilómetros até à Índia e são raras as pessoas com quem nos cruzamos que não aparentam vir de uma qualquer rua de Mumbai. Restaurantes, lojas de telemóveis, mercearias, néones coloridos em sânscrito e negociatas em Marati. No final da rua, de novo Paris. Outro passeio interessante, será sair na estação de metro de Belleville. Se descermos o Boulevard de Bellevile, teremos mercearias, restaurantes e bares (sim, bares) com esplanada, geridos pela comunidade muçulmana. Por todo o lado abundam especialidades argelinas, pastelaria marroquina ou indivíduos em trajes tradicionais. O cenário sera bem diferente se subirmos a inclinada Rue de Belleville. Não levara muito tempo até que nos demos conta que se multiplicam os traços orientais e que os transeuntes não falam francês. Aqui é o melhor sítio para comer chinês. A pequena comunidade vive como se nunca tivesse abandonado o país da muralha. Cabeleireiros chineses, supermercados com produtos desconhecidos de qualquer francês, e onde adolescentes de traços orientais registam o preço de embalagens com caracteres indecifráveis, enquanto alternam, com desenvoltura, o francês e o mandarim. Um pouco acima já abandonámos a China e cruzamos um grupo de locais a dançar o tango. É tempo para um pequeno apéro ao som da banda convidada, numa esplanada sobre o Jardim de Belleville, e mais uma bela vista sobre a cidade.