Ás vezes dou por mim renitente em assumir que estou. Indeciso de ser, embriagado pela tentação de não passar de substância volúvel, em contínua observação, matéria em construção, a definir. Mas tudo à minha volta me pressiona a mostrar que existo, que tomo uma posição, que não sou indiferente.
Este fim de semana, no meio do mar, não pude deixar de assistir a uma metáfora da minha vida. O mar revolto do alentejo dava ares da sua beleza rude e eu insistia em poupar o meu fôlego e energias para aquela onda ideal, aquela formação que justificaria cada entrega dos meus movimentos, uma onda em que eu fluiria com gratificante prazer, satisfeito por me ter lançado a ela. As ondas iam passando e eu hesitava repetidamente. Argumentos não faltavam: um surfista mais bem colocado, uma onda que iria fechar abrutamente, uma parede demasiado íngreme e intimidante.
No mar, um pouco como na vida, existe um fronteira que divide a zona de rebentação ( ou inside), da zona de calma onde as ondas não rebentam ( o outside). Esta fronteira nem sempre está claramente definida, mas é neste limbo que o surfista se coloca. É aqui, onde a onda atinge a sua altura máxima antes de ceder ao peso da sua crista e rebentar, que se aproveita o seu impulso para fluir ao longo da massa de água, que se ergue paralela à costa. Alguns metros para lá desta linha e apenas se colhe uma massa de água turbulenta, alguns metros atrás e a impulsão não chega para nos arrastar.
Embora no outside, a corrente arrastava para a zona de rebentação e eu, ora cedia hesitante, preparando-me para me lançar a alguma onda, ora regressava ao outside para evitar um set inesperado. Foram inúmeras as hesitações e a cada duas aproximava-me do inside e as ondas rebentavam diante de mim, envolvendo-me numa turba de água revolta. É certo que "apanhei" algumas ondas, mas não tantas como poderia ter apanhado se não estivesse tão preocupado em controlar o momento, em querer o mar moldado a mim, rogando pragas a poseidon pela falta de consideração.
Insisto (é patológico) em querer ficar no outside a escolher ondas à la carte, mas a vida sempre me puxa para a realidade com violentas turbas de água.
Moral da história: Hajam umas ondas pelo caminho.
PS: Eu gosto de surfar mas sou um gajo com um pulmão fraquinho.
segunda-feira, abril 28, 2008
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário